Isolamento Social?



Sempre demoro um bocado de tempo para escrever. Acho isso uma falha terrível mas, que aqueles que leem essas impressões todas sobre a minha vida, que me desculpem. Acho que devemos apenas escrever quando estamos firmemente convencidos de que nossas verdades possam servir a benefício à alguém.
Esses dias de isolamento social pelo Covide19, arrumando velhos livros, achei uma velha revista pornográfica gay, provavelmente produzida na década de 80...Então me lembrei...
Já não sou tão novo, sou de um tempo em que ser gay em uma cidade do interior era um caminho longo a ser trilhado pelo menos nos quilômetros iniciais, sozinho, e não pense que era fácil achar algum companheiro nessa estrada. Meu consolo eram revistas gays pornôs, compradas escondidas em uma banca caindo aos pedaços em um lugar bem afastado do Centro da cidade onde o dono havia chegado a nível de necessidade tamanho para manter o seu negócio que admitia a venda daquele material. Comprar revistas heterossexuais de nudez, naquela época, já era bem complicado, imaginem as gays. Enfim, não faço apologia a pornografia gay, nem tão pouco quero erguer bandeiras ao saudosismo mas, quero demonstrar o quanto era importante ter “um lugar”, um lugar físico onde você por alguns segundos poderia acreditar que não estava sozinho, mesmo que fosse uma banca decadente ou um cinema sujo a beira da falência.
Vivi uma época de bares e boites, saunas e, por um momento parecia que estávamos colonizando a cidade, criando espaços onde poderíamos nos encontrar, conversar, tocar..., no entanto a era das “redes sociais” trouce novas formas de encontrar e interagir e as pessoas começaram mesmo a se afastar fisicamente. Em um período que estava em um relacionamento estável fiquei bastante distante do que chamaria de “ambiente gay”, porém quando me vi sozinho novamente esses locais já não existiam em minha cidade e de certa forma comecei a perceber um movimento no sentido oposto em que as pessoas voltavam para um armário, desta vez virtual. Entendo o medo da violência, a exposição em uma sociedade preconceituosa e sou totalmente favorável a vida discreta principalmente em regiões onde o avanço das relações sociais ainda não alcançou a aceitação razoável, mas ver esses locais e espaços desaparecendo da cena urbana, mesmo que houvessem sido clandestinos, me deixa um pouco preocupado.
Será que estamos abandonando o campo de batalha, será que preferimos nos esconder novamente, será que interagir nas cidades não é realmente importante para o avanço de uma normalização social? Penso na importância do contato humano, no aprendizado que somente acontece quando existe confiança, as palavras francas e o olho-a-olho. Talvez as pessoas tenham criado alguma espécie de armário como o de Nárnia, onde a sociedade convencional deixou de ter importância, talvez tenham encontrado um lugar virtual onde beber cerveja e olhar os garotos passando não tenha mais graça... talvez, os campos de batalha não estejam mais nas ruas e o contato real humano deixou de ser interessante...Talvez esse seja o verdadeiro isolamento social. O isolamento social que nós mesmo estamos criando.


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